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Vitor Ramil: Um Astronauta Lírico em “Mantra Concreto”

Vitor Ramil emocionou a plateia carioca no Teatro Ipanema, no dia 5 de agosto, com seu show “Mantra Concreto”, dentro do projeto “Terças no Ipanema”. A apresentação, que recebeu quatro estrelas da nossa avaliação, foi uma verdadeira viagem poética, um mergulho profundo na obra de Paulo Leminski (1944-1989).

Ramil confessou ter se emocionado profundamente ao ouvir a versão em português de “Tierra”, de Xoel López, presente em seu álbum “Campos Neutrais” (2017), e também ao finalizar a composição das músicas baseadas nos poemas de Leminski para seu novo trabalho, “Mantra Concreto” (2024), lançado em outubro passado. Olha só, ele se apresentou como um verdadeiro astronauta lírico, flutuando entre a métrica precisa e a emoção crua que permeiam a poesia do show.

A apresentação contou com a participação especial de Adriana Calcanhotto, sua conterrânea gaúcha. Ela se juntou a Ramil em “Viajei” (2007) e “Estrela Estrela” (1981) – esta última, regravada por Adriana Partimpim em “O Quarto” (2024). Apesar da expectativa, a participação, digamos, foi um pouco protocolar, não roubando a cena como se esperava.

Na real, o destaque mesmo ficou por conta do talento inegável de Ramil, que se apresentou majoritariamente solo, acompanhado apenas de seus violões. A iluminação impecável de Marcelo Linhares e a performance impecável de seus músicos, Alexandre Fonseca (bateria, tablas, percussão e programações) e Edu Martins (baixo e synth bass) – também presentes no álbum – complementaram a atmosfera mágica.

Imaginem só: Ramil, vindo diretamente da imaginária Satolep (anagrama de Pelotas, sua cidade natal), declamando os versos antilíricos de Leminski, o poeta curitibano conhecido por sua concisão e ligações com a poesia concreta (como em “Anfíbios”, “Sujeito Indireto” e “Teu Vulto”) e com a linguagem coloquial (“Um Bom Poema”). Incrível!

O show, baseado em oito das quinze faixas do álbum inspiradas nos poemas de Leminski, também passeou por sucessos anteriores de Ramil, como “A Ilusão da Casa” (2007) e “Astronauta Lírico” (2007), ambas gravadas por Ney Matogrosso, que inclusive participou da estreia do show em 29 de julho.

Como esquecer o convite irresistível de “Loucos de Cara” (1987), do álbum “Tango”, com seus versos impactantes: “Não importam vitórias / Grandes derrotas, bilhões de fuzis / Aço e perfume dos mísseis / Nos teus sapatos”? Essa música, composta por seu irmão Kleiton Ramil, reapareceu épica no palco, mostrando toda a força de sua melodia. Aliás, a genialidade de Vitor também ficou evidente em “Não é Céu” (1996), uma bossa vibrante que encerrou o show antes do bis.

No bis, a emoção continuou a mil com “Joquim” (1987), também de “Tango”, uma homenagem ao pelotense Joaquim da Costa Fonseca Filho (1909-1968). A letra, toda ela com a liberdade poética característica de Ramil, ganhou a melodia de “Joey” (1976), de Bob Dylan e Jacques Levy (1935-2004). Essa versão em português conectou o folk nova-iorquino à sonoridade singular de Satolep, criando algo único. E para finalizar, um retorno à poesia de Leminski com “Caricatura” (2024), com seus versos melancólicos e concretos: “Tudo, tudo, tudo / Não passa de caricatura / De você, minha amargura / De ver que viver não tem cura / Viver não tem cura”.

Em resumo, entre a lágrima e a métrica, Vitor Ramil demonstrou como a música e a poesia podem, sim, ser bálsamos para a alma, amenizando as dores da vida. Uma apresentação memorável!

Fonte da Matéria: g1.globo.com