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Trump recuou? Estratégias de negociação do presidente americano incluem ameaças e concessões, diz economista

Donald Trump “amarelou” de novo? A pergunta ecoa entre especialistas e internautas após o presidente americano anunciar isenções para quase 700 produtos brasileiros, contrariando a promessa inicial de tarifas de 50% sobre importações brasileiras. Em julho, o anúncio pegou muita gente de surpresa. Afinal, o começo do mês já tinha sido marcado por ameaças pesadas, incluindo sanções pessoais contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal. Mas, na semana seguinte à imposição das sanções, Trump deu um passo atrás. Um alívio para setores como o de suco de laranja e aeronaves, que, apesar das isenções, ainda sofrem com a taxa de 10% anunciada em abril.

Essa reviravolta reacendeu o debate sobre a “teoria do Taco”, ou “Trump always chickens out” (Trump sempre amarela, em tradução livre). A expressão, criada pelo colunista de finanças do Financial Times, Robert Armstrong, descreve a estratégia de Trump de fazer ameaças grandiosas para, em seguida, recuar parcialmente, o que acaba se tornando lucrativo para investidores que apostam nesse comportamento.

Armstrong observou esse padrão em abril, quando Trump anunciou seu “Dia da Libertação”, com tarifas para quase todos os parceiros comerciais dos EUA. As bolsas americanas desabaram com o temor de uma recessão, mas muitos investidores – e eles acertaram – apostaram em uma “amarelada” de Trump, comprando ativos a preços baixos. O recuo veio na semana seguinte, e as bolsas dispararam. Lucro garantido para quem apostou no “Taco”.

E agora? Mais um “Taco”? Em julho, Trump iniciou uma nova ofensiva tarifária global, enviando cartas a líderes mundiais com ameaças de tarifas a partir de agosto, incluindo o Brasil. Países como o Japão e a União Europeia negociaram acordos, resultando em tarifas menores, mas ainda bem acima dos níveis anteriores. A dúvida que paira no ar: Trump vai cumprir suas ameaças ou vai “amarelar” de novo? As isenções no caso brasileiro seriam, então, mais uma demonstração dessa tática?

Para David Lubin, pesquisador sênior do programa de Economia e Finanças Globais do renomado instituto britânico Chatham House (Royal Institute of International Affairs), o “Taco” já faz parte da estratégia de negociação de Trump. O presidente americano, segundo Lubin, faz ameaças muitas vezes irreais para pressionar o outro lado a negociar. No caso do Brasil, houve, sim, um elemento “Taco”, mas o recuo também se deu pela preocupação com os danos econômicos que as tarifas altas causariam à economia americana.

“Claramente houve uma espécie de ‘amarelada’, pois as isenções para aeronaves, suco de laranja, ferro e petróleo visam limitar os danos econômicos à economia americana”, explicou Lubin em entrevista à BBC News Brasil. Essa estratégia, segundo ele, também é usada em negociações com a China. “Se moderar uma posição de negociação pode ser descrito como ‘amarelar’, então, sim, o Taco está meio que inserido na estratégia de negociação de Trump.”

Para o economista, Trump busca dois objetivos com as tarifas, as sanções a Moraes e as isenções: apoio político ao ex-presidente Jair Bolsonaro e contenção dos aumentos de preços para o consumidor americano. A política tarifária, na visão de Lubin, serve principalmente para expressar a raiva de Trump contra o governo Lula, mesmo que isso possa beneficiar Lula politicamente dentro do Brasil. “O presidente Trump está disposto a aceitar o custo dessa ferida autoinfligida para expressar sua raiva contra um antagonista político”, afirma Lubin.

Trechos da entrevista com David Lubin:

**BBC News Brasil:** Houve um “Taco” no caso Brasil?

**David Lubin:** Não exatamente. O “Taco” original se referia ao medo de Trump de que sua política tarifária afetasse os mercados financeiros americanos. O “Dia da Libertação” foi um exemplo claro disso. Mas o caso do Brasil é diferente. As isenções para aeronaves, suco de laranja etc. demonstram um desejo de limitar os danos econômicos e apoiar o objetivo principal de Trump: expressar raiva contra Lula. Há um aspecto “Taco”, mas é um uso singular e político das tarifas.

**BBC News Brasil:** Por que Trump recuou no caso do Brasil?

**Lubin:** Ele quer atingir dois objetivos: pressionar o governo Lula e limitar os danos econômicos aos EUA. Uma política tarifária visível e vocal permite que ele demonstre sua hostilidade a Lula, ao mesmo tempo em que minimiza os impactos econômicos.

**BBC News Brasil:** Qual o dano econômico real para os EUA?

**Lubin:** Preços mais altos e redução da oferta de produtos essenciais como suco de laranja e aeronaves, onde o Brasil tem forte presença. As isenções buscam proteger a população e a economia americana dos efeitos dessa raiva contra Lula.

**BBC News Brasil:** Trump acredita que conseguirá fazer o Brasil ceder?

**Lubin:** É uma pergunta interessante. Ironicamente, ao expressar raiva contra Lula, ele pode estar fazendo um favor político a Lula.

**BBC News Brasil:** Os acordos firmados por Trump são viáveis? Ele realmente obtém vitórias?

**Lubin:** Há algumas vitórias, como o aumento da receita tarifária e a possível redução de déficits comerciais bilaterais. Mas, no geral, é difícil ver como a política tarifária afeta o déficit comercial dos EUA, que é determinado pelo equilíbrio entre poupança e investimento. No caso do Brasil, a tarifa é economicamente insignificante e não tem relação com comércio ou questões políticas internas dos EUA.

**BBC News Brasil:** O “Taco” é uma estratégia vencedora para Trump?

**Lubin:** Acho que a política comercial de Trump é ruim para o mundo e para os EUA. Ele tem uma eleição, um eleitorado a apoiar e um projeto político – apoiar líderes de direita em outros países.

**BBC News Brasil:** E a negociação com a China? Trump pode recuar lá também?

**Lubin:** Trump ficou surpreso com a firmeza da China. A influência chinesa sobre o fornecimento de terras raras forçou Trump a negociar. Recentemente, os EUA parecem tentar evitar irritar Pequim.

**BBC News Brasil:** Haveria um “Taco” na negociação com a China?

**Lubin:** Em alguns casos, Trump pode ter um plano. Não tenho certeza se ele realmente considerou seriamente tarifas de 145% sobre a China. O “Taco” está inserido na sua estratégia de negociação.

**BBC News Brasil:** Você ficou surpreso com a forma como Trump negociou com o Brasil?

**Lubin:** Vimos isso desde janeiro. No caso do Brasil, Trump está usando mais ferramentas do que em outros países, tentando apoiar a direita brasileira com mais do que retórica.

**BBC News Brasil:** Qual a melhor resposta do Brasil?

**Lubin:** Não cabe a mim aconselhar o governo brasileiro, mas o silêncio pode ser a melhor estratégia para preservar a economia brasileira. Trump parece se alimentar de antagonismo.

(Links para os artigos mencionados no texto original seriam incluídos aqui, caso disponíveis.)

Fonte da Matéria: g1.globo.com