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Tarifaço de Trump: Um Mês de Desespero para Produtores Brasileiros

Um mês se passou desde que o então presidente dos EUA, Donald Trump, anunciou a sobretaxa de 50% sobre produtos brasileiros, em 9 de julho. Para muitos produtores, o “tarifaço”, como ficou conhecido, foi um dia “desesperador”, nas palavras da empresária Daniele Alckmin. A reportagem do g1 ouviu produtores que sentiram o impacto dessa decisão na pele.

Daniele, diretora-executiva da Agrorigem, exportadora de cafés especiais em Santa Rita do Sapucaí (MG), lutava há dez anos para conquistar clientes nos EUA. Eles representavam 30% do faturamento anual da empresa. Ela tinha contratos firmados para enviar dois contêineres – 640 sacas, ou 34,8 toneladas de café – a um importador com quem trabalhava há anos. “Todo ano ele fazia essa compra”, lembra Daniele, filha de produtor rural.

Aí veio o baque. Com o anúncio da sobretaxa, o navio programado para 21 de julho, e outro para setembro, foram cancelados após várias tentativas de remarcação – cada uma com seus custos. O importador americano alimentava a esperança de que o café fosse incluído na lista de exceções, afinal, mais de 30% do café consumido nos EUA vem do Brasil. “Ele me dizia: ‘calma, eu confio que isso não vai seguir’”, recorda Daniele.

Mas a esperança acabou. Trump não incluiu o café na lista de exceções. O importador chegou a propor dividir o custo da sobretaxa: “E se você ficasse com 25% e eu com 25%?”, sugeriu. Daniele recusou. “Minha margem de lucro é muito pequena!”, explicou. Resultado: o contrato foi cancelado. “Fiquei muito chateada. Não é justo. O imposto de importação é do importador, não do exportador”, desabafa a empresária, lamentando a perda de um cliente que se tornou amigo da família. E pior: Daniele só soube depois do prazo que poderia ter evitado a taxa de 50% se tivesse enviado os produtos até 6 de agosto. “Essa informação chegou tarde demais!”, lamenta.

O prejuízo para Daniele vai além do financeiro. É o desgaste emocional de anos de trabalho. Desde 2015, ela investe em viagens e participa de feiras nos EUA, chegando a contratar consultores. “Na feira do Texas este ano, por exemplo, eu contratei um consultor. Mas não estamos conseguindo colher frutos porque ninguém nos EUA quer comprar café brasileiro agora”, conta. A Agrorigem já vê clientes migrando para cafés do Vietnã e da Colômbia. “É triste pensar em todo o esforço para fortalecer esses vínculos, em todos os investimentos feitos. Os compradores já vieram ao Brasil, fizeram tours pelas fazendas…”, desabafa Daniele.

A empresária descarta medidas de socorro do governo federal. Seu problema agora não é financiamento, mas redirecionar a produção destinada aos EUA. Felizmente, os preços internacionais do café estão altos, principalmente o café especial, o que protege financeiramente o negócio da Agrorigem. A empresa já busca novos mercados na Noruega e Dubai, enviando amostras, mas o tempo urge: para manter a classificação “especial”, os contratos precisam ser fechados até outubro. Depois, o café será vendido por um valor menor, pois perde qualidade com o tempo.

A situação de Daniele não é única. Em Cipó (BA), o apicultor Joaquim Rodrigues, também sofre com o tarifaço. As exportadoras que compram seu mel reduziram o preço em cerca de 18%, de R$ 17 para R$ 14 o quilo. Joaquim produz cerca de 20 mil kg de mel por ano, com 90% destinados à exportação, principalmente para os EUA (80% do total exportado). O consumo interno de mel no Brasil é baixo, deixando os produtores dependentes do mercado externo. Apesar de não ter certificação própria, a produção de Joaquim é monitorada pelas exportadoras, que vendem o mel com selo orgânico. Como presidente da Associação dos Apicultores de Cipó (AAPIC), que reúne 42 produtores, ele espera ajuda do governo. O Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar anunciou o uso de recursos do PNAE e do PAA para comprar produtos afetados pelo tarifaço, incluindo mel, mas Joaquim aguarda detalhes sobre como acessar esses recursos, estando em contato com a SUAF-BA.

No Vale do São Francisco (PE), o produtor de uva Jailson Lira vive a incerteza. Os EUA representam 40% do seu faturamento, e ele só saberá o preço final da uva quando a exportação começar na última semana de setembro. Ele trabalha com um sistema de consignado, enviando as uvas para uma distribuidora nos EUA, que faz a revenda e cobra uma comissão de 6% a 8%. “O negócio é feito sempre no escuro. E agora fica mais ainda”, afirma Jailson, que busca alternativas, mas sabe que a concorrência por novos mercados será acirrada. “Os Estados Unidos pagam bem. São excelentes clientes. A gente tá perdendo uma grande oportunidade”, lamenta.

Fonte da Matéria: g1.globo.com