Na Symrise, gigante alemã de fragrâncias e sabores, um aroma cítrico paira no ar, impregnando os jalecos dos trainees. São eles, os “narizes”, os profissionais que aprendem a arte de tornar as coisas… mais cheirosas! Esses caras são, na real, super-heróis do aroma, responsáveis por moldar a experiência olfativa de milhões de consumidores ao redor do mundo.
Enquanto perfumistas de grifes criam fragrâncias para perfumes de luxo, esses especialistas trabalham nos cheiros que a gente encontra no dia a dia: desde a pasta de dente até aquele salgadinho que você ama! Olha só a importância do olfato: esse sentido poderoso, capaz de despertar emoções e memórias, influencia muito na hora de escolher um produto – seja um alimento, um detergente ou um creme hidratante.
Na sede da Symrise, em Holzminden (uma cidadezinha tranquila ao sul de Hanover), o dia na escola de perfumaria começa sempre igual: vendados, os alunos farejam dezenas de pequenos frascos. “É tipo afinar um instrumento antes de tocar”, explica Alicia De Benito Cassado, uma ex-pianista espanhola de 32 anos que trocou as teclas pelo universo dos aromas. A mudança, pra ela, foi natural: na adolescência, já criava seus próprios perfumes, combinando-os com a poesia e música que escrevia.
“Pra mim, nem tudo precisa cheirar bem, sabe?”, ela conta. “Às vezes, o cheiro ruim também nos ajuda a nos conhecer melhor.” Mas, pros clientes, a história é outra, completa Alicia: “No fim das contas, precisamos criar aromas fortes, bonitos, poderosos… e acessíveis”.
Ser um “nariz” profissional é trabalho de tempo integral, com um programa de treinamento de três anos. Um amaciante, por exemplo, pode ter até 80 componentes – bem mais que um perfume de luxo! E os melhores farejadores conseguem identificar mais de 1.000 odores diferentes, mesmo de olhos fechados! Shangyun Lyu, de 31 anos, veio da China para estudar na escola e diz que, pra se virar bem, um profissional precisa conhecer cerca de 500 aromas. Descompor os odores em seus componentes químicos é fundamental. “Quando criança, eu só sentia jasmim ou gardênia”, ele conta. “Agora, reconheço os componentes químicos: é uma mistura de vários elementos”.
Os estudantes pesam os ingredientes miligrama a miligrama, misturam, cheiram, e começam tudo de novo! Eles replicam odores existentes para entender a estrutura e, a partir daí, inovar. “Quando desenvolvemos um perfume, é crucial que várias pessoas o cheirem”, explica Marc vom Ende, mestre perfumista de 56 anos e chefe da escola. “Cada um percebe o cheiro de um jeito diferente”.
Cheiros agradáveis não são criados a qualquer custo. As regras mudam com o tempo. O Lilial, uma substância química antes usada por suas notas florais, foi banido na União Europeia desde 2022 por preocupações com a pele e o sistema reprodutivo. Fragrâncias para o corpo têm regulamentações mais rígidas que detergentes, explica Attiya Setai, trainee sul-africana de 27 anos. “Temos mais restrições nas matérias-primas e precisamos substituir ingredientes proibidos por outros que estejam dentro das normas”, ela afirma.
Os gostos também variam pelo mundo. Shangyun cita o exemplo de shampoos chineses que são sucesso na China, mas teriam dificuldades na Europa. “Algo ultrapassado em um país pode ser novidade em outro”, ele explica. O custo também entra na equação. A Symrise extrai compostos aromáticos de resinas de madeira, um subproduto da indústria papeleira – uma iniciativa “que faz sentido econômico e ambiental”, diz vom Ende.
A indústria de perfumaria emprega cerca de 500 perfumistas no mundo todo, sendo 80 deles na Symrise, que tem 13 mil funcionários e comercializa cerca de 30 mil produtos para clientes que vão de confeitarias a fabricantes de ração animal e protetores solares. A Symrise concorre com empresas como DSM-Firmenich (Suíça e Holanda) e Givaudan (Suíça).
A inteligência artificial tem ganhado espaço, com programas prevendo tendências. Mas, pelo menos por enquanto, as máquinas não cheiram, mesmo entendendo fala e lendo textos. “Somos apoiados pela IA, mas o nariz tem a palavra final”, conclui vom Ende.
Fonte da Matéria: g1.globo.com