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Legendários: Lágrimas na Montanha – Um Diário, Dia 2

“Homens choram na montanha”, a frase ecoou perto de uma casa abandonada, quase em ruínas, durante uma das micropalestras do retiro Legendários. Essa cena, no segundo dia da minha jornada, foi um divisor de águas. Pra quem acompanhou o primeiro dia do diário, sabe qual o objetivo: entender o que rola nesse retiro masculino e cristão que bombou nas redes sociais. Sou um cara cristão, criado em família evangélica, e a curiosidade me trouxe até aqui.

Se no primeiro dia a gente sentiu na pele o cansaço físico e a disciplina quase militar, no segundo, as coisas mudaram de tom. Memórias, traumas, relações familiares… tudo veio à tona. As conversas giraram em torno de pais ausentes, reconstrução familiar e do peso que um homem carrega quando não consegue lidar com o passado.

A cada desafio – seja na corda bamba, nas trilhas ou em volta da fogueira – surgiam perguntas difíceis: “Que homem te ensinou a ser homem?”, “Que tipo de pai você quer ser?”. O choro deixou de ser exceção. Homens se ajoelhavam, se abraçavam, se entregavam à emoção. O silêncio deu lugar às histórias, sabe? E tudo isso com caras fisicamente exaustos, fragilizados pelos desafios dos dois dias.

O g1 publica esse diário em quatro partes, de sábado (26) a terça (29). Não levei gravador, celular, nada disso – era proibido. Mas anotei tudo, e as ilustrações do g1 se baseiam nessas anotações. O que conto aqui é o que vi, ouvi e vivi. Quase um reality show, né?

Madrugada escura, gritos de comando ecoando entre as barracas. Os 170 “senderistas” (assim são chamados os participantes) se levantaram às pressas, desarmando as barracas e preparando as mochilas. Cansaço, confusão… e um pouco de raiva, vamos ser sinceros! Pouco sono, né? A gente mal imaginava que aquele seria o dia mais longo e difícil da vida de muitos ali.

Exercícios militares, estilo competição. Passar debaixo das pernas de outros participantes, formar uma “centopeia” usando só os braços, rolar por cima dos outros… Olha só, a experiência era intensa! A gente foi dividido em “famílias”, e as vencedoras ganhavam um descanso estratégico.

A “abuelita”, o “perrito” e um homem a menos. Um dos exercícios mais inusitados é o da “abuelita”. O “Voice”, principal líder dos Legendários (vale a pena ler a entrevista dele no g1!), conta uma história da avó do Chepe Putzu, criador do movimento, na Guatemala. A vovó tinha um “perrito” que adorava carinho, e ela ria quando ele se deitava de barriga pra cima, sacudia as patas e chorava por atenção. Aí, todos tinham que imitar o cachorrinho. Um brother, distraído, acabou se deitando num monte de esterco… Coitado!

Depois dos exercícios, a caminhada recomeçou. Mas logo um senderista pediu passagem. Nosso líder pediu pra orar pelo cara, que respondeu com um palavrão: “Não quero oração, quero ir embora! Vocês são fanáticos!”. De 170, passamos a ser 169.

Micropalestras, lições e a casa abandonada. A manhã foi uma sequência de micropalestras e desafios. Numa poça de lama, tivemos que passar lama no rosto, tipo Rambo! Em outra, a família teve que segurar uma corda enquanto um brother tentava dar uma volta completa em cima dela. As palestras falavam sobre se tornar “homens inquebrantáveis”, que não cedem ao pecado, trabalham em família, e são diferentes dos outros homens, que se entregam à corrupção e destroem as famílias.

A casa abandonada foi um momento marcante. Paramos diante de uma casa destruída, com mato crescendo por todos os lados e brinquedos espalhados. O legendário perguntou: “O que vocês veem?”. A mensagem: para Deus, aquela casa representa a família, e ela sempre terá salvação. Vários homens choraram, alguns soluçando, sendo consolados pelos irmãos.

Da base ao cume, uma subida intensa. Sentados na base da montanha, começamos a subida em silêncio, orando ou cantando hinos. A trilha era íngreme, com alguns trechos recém-abertos, com cordas para ajudar na subida. Difícil manter a concentração na oração com a mochila pesada, né?

A vista, a presença, a chegada. Chegando ao topo, a vista era incrível! Montanhas cobertas por mata fechada, palmeiras… Um grupo de Legendários nos recebeu com palmas e gritos de “AHU” (Amor, Honra e Unidade). Era meio-dia, mas ainda tinha muito pela frente.

Confia e vai? Depois de uma celebração rápida, um exercício de confiança: vendados, de mãos dadas, seguimos um caminho sinuoso. A mensagem: a família precisa confiar no líder, e o legendário precisa confiar em Deus quando não enxerga o caminho.

A longa e sinuosa “milha extra”. Aí veio a micropalestra sobre a “milha extra”: ir além dos limites, carregar um fardo maior, se superar. E foi exatamente isso que aconteceu. Depois do almoço (90 minutos, um luxo!), começamos a caminhada mais difícil. Ombros doloridos, costas, pés… A noite caiu, a gente só pensava: “Preciso aguentar mais um pouco”.

Finalmente chegamos a um novo acampamento. Desta vez, as barracas eram organizadas por família. Arrumamos tudo, alguns fizeram macarrão, outros foram dormir imediatamente. Eu, com o sono acumulado, fui direto pra barraca. Boa decisão, porque logo vieram os gritos de comando…

Relação pai e filho, o quebrantamento. Seguimos para uma fogueira. Um legendário tocava violão e cantava. O sermão foi sobre paternidade, a relação com o pai na infância, o peso disso na vida adulta. Ele contou sobre a ausência do pai num momento importante da sua adolescência, o nó da gravata. E como os problemas com o pai podem afetar a relação com Deus. Um momento de cura. Muitos homens choravam, se abraçavam, alguns ajoelhados. Os Legendários se aproximaram, conversaram e oraram com a gente. Me emocionei muito. Acho que qualquer um se emocionaria.

Tem mais? Lembrando de um retiro da minha adolescência, o “Encontro com Deus”, me veio a cabeça a semelhança com o Legendários. Aos 13 anos, lembro da energia, da sensação de ser um “queridinho de Deus”. Esse poder de transformação estava agindo nos homens ali. E se já foi tão intenso, o que nos espera nos próximos dias? Naquele momento, eu só queria descansar. Cheguei até a sonhar com um hotel 5 estrelas… Mas, claro, não foi bem assim.

Fonte da Matéria: g1.globo.com