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Itaú demite funcionários em regime remoto: monitoramento no home office tem limites?

O Itaú Unibanco demitiu cerca de mil funcionários em regime híbrido ou remoto nesta semana, segundo informações do Sindicato dos Bancários. A justificativa? Uma avaliação de produtividade no home office que, segundo o banco, apontou incompatibilidades entre as atividades desempenhadas e o registro de ponto dos trabalhadores. Em nota oficial ao g1, o Itaú alegou uma “revisão criteriosa de condutas relacionadas ao trabalho remoto e registro de jornada”. (Leia a nota completa). Baixe o app do g1 e fique por dentro das notícias em tempo real!

Essa decisão reacendeu um debate importantíssimo entre especialistas em trabalho e emprego: como, afinal, medir a produtividade no home office? E qual o limite do monitoramento do computador do empregado? Na real, essa é uma questão complexa.

Segundo a advogada trabalhista Luana Couto Bizerra, as empresas podem, sim, usar softwares de monitoramento em computadores corporativos. Isso é permitido pela legislação trabalhista, desde que haja transparência, proporcionalidade e uma finalidade legítima. O foco deve ser no controle de jornada e produtividade por meios adequados, como ponto eletrônico ou metas claras, evitando qualquer tipo de constrangimento ao funcionário. A privacidade do trabalhador e a LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais) precisam ser respeitadas, viu? “Exigir a câmera ligada o tempo todo? Isso não é permitido! O uso deve ser pontual e justificado, tipo em reuniões ou treinamentos”, explica a especialista. O problema, segundo ela, surge quando a empresa tenta instalar softwares de monitoramento no computador pessoal do funcionário. “Aí, sim, existe o risco de invasão de privacidade”, alerta.

Outro ponto crucial, destacado pela especialista, é o “direito à desconexão”, previsto na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho). Ou seja: a empresa pode exigir o registro de ponto, mas isso não quer dizer que o funcionário precisa estar disponível 24/7. Intervalos e necessidades pessoais precisam ser respeitados. E olha só: tempo de tela não é sinônimo de produtividade. O funcionário pode estar fazendo tarefas que não exigem interação direta com o computador, como análise de documentos, ligações com clientes, planejamento estratégico… Sistemas que só medem a atividade do mouse e do teclado podem dar informações bem distorcidas da realidade.

Um ex-funcionário do setor de marketing do Itaú, que preferiu não se identificar, confirmou isso. Ele relatou que passava boa parte do dia usando celular ou TV para estudar materiais relacionados ao trabalho, mas esse tempo não era monitorado. Interessante, né? Os gestores até incentivavam a busca por referências nas redes sociais, mas a empresa não fornecia celular corporativo para todos. “Em 2025, só coordenadores e gerentes tinham aparelhos corporativos. O trabalho fora do computador, portanto, não era monitorado”, contou o ex-colaborador.

O sindicato dos bancários criticou duramente as demissões, afirmando que foram feitas sem aviso prévio e sem diálogo, um “desrespeito aos bancários e à relação com o movimento sindical”. Maikon Azzi, diretor do sindicato e funcionário do Itaú, declarou em nota: “O banco alega que os desligamentos se baseiam em registros de inatividade nas máquinas corporativas, em alguns casos, períodos de quatro horas ou mais de suposta ociosidade. Mas consideramos esse critério extremamente questionável, pois não leva em conta a complexidade do trabalho bancário remoto, possíveis falhas técnicas, problemas de saúde, sobrecarga ou a própria organização do trabalho pelas equipes”.

Para Leyla Nascimento, presidente da ABRH Brasil (Associação Brasileira de Recursos Humanos), o ideal é que o trabalhador receba feedback sobre o desempenho antes de uma demissão, embora a advertência formal não seja obrigatória. “O acompanhamento constante da liderança é essencial”, afirma. Funcionários demitidos ouvidos pelo g1 relataram não ter recebido avaliações negativas e, em alguns casos, até foram premiados internamente. Muitos também contaram sobre as dificuldades diárias para registrar o ponto eletrônico. “Eu não esperava! Estava em um programa de desenvolvimento individual (PDI), sempre com feedbacks positivos e recebendo mais funções. Independentemente de trabalhar 8h ou 3h, nunca houve questionamento se as entregas fossem feitas no prazo”, disse um ex-colaborador. Outro ex-funcionário também se disse surpreso: “Havia momentos de ociosidade na minha área, mas eu sempre informava meus líderes sobre as demandas em andamento e quando estavam concluídas”.

O trabalho remoto, que ganhou força na pandemia de Covid-19, ainda gera muitas dúvidas. Como o g1 mostrou em fevereiro, muitas empresas estão voltando ao modelo presencial, alegando dificuldades com produtividade e integração de equipes. Em São Paulo, a taxa de vacância em prédios corporativos caiu para os menores níveis desde o início da pandemia em 2020.

Para Leyla Nascimento, o ideal é um acordo claro entre empresa e funcionário sobre direitos, deveres e formas de acompanhamento. O monitoramento, segundo ela, é necessário para manter a confiança. “Tanto no presencial quanto no remoto, o profissional está sendo acompanhado. Ao aceitar o trabalho híbrido, o empregado deve compreender que o monitoramento diário faz parte da rotina da empresa”, explica. Ela também destaca os desafios emocionais do trabalho remoto, como a dificuldade de concentração e a sensação de isolamento, fatores que afetam a produtividade e reforçam a necessidade de acompanhamento.

Para o advogado trabalhista Maurício Corrêa da Veiga, boas práticas no home office incluem fornecimento de equipamentos, capacitação, regras claras, monitoramento proporcional, respeito à privacidade e ao direito à desconexão. Já para os funcionários, cumprir horários e metas, comunicar problemas técnicos, manter a postura profissional e cuidar dos equipamentos e informações da empresa são fundamentais. Em resumo, o trabalho remoto exige disciplina, flexibilidade e confiança mútua. O monitoramento deve ser visto como ferramenta de acompanhamento de resultados, sempre respeitando os direitos e a privacidade do trabalhador. Defender o home office nas redes sociais custou o emprego para alguns.

Fonte da Matéria: g1.globo.com