Donald Trump, durante entrevista coletiva na Casa Branca em 5 de setembro de 2025 (Reuters/Brian Snyder), tá mexendo os pauzinhos para enfraquecer o dólar. Pelo menos, é o que economistas consultados pelo g1 acham. A estratégia dele? Criar um cenário, digamos, “animado”, com aumento de tarifas e ataques ao Federal Reserve (Fed), o banco central americano. A ideia? Desvalorizar a moeda. Mas será que vai dar certo? A gente explica.
A verdade é que a economia americana enfrenta problemas sérios, e o dólar, apesar de tudo, continua rei. A vontade de dar uma “diminuída” no dólar não é novidade: outros presidentes já tentaram, sem muito sucesso. (Leia mais abaixo)
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Trump já deixou claro a sua insatisfação com a força do dólar. Em julho, antes de uma viagem à Escócia, ele disse gostar de um dólar forte, mas que, na real, dá pra ganhar muito mais com um dólar mais fraco. A frase dele foi mais ou menos assim: “Dólar forte soa bem, mas não rola turismo, não vende trator, caminhão, nada! Só serve pra controlar a inflação”.
Tá certo que um dólar forte atrapalha os planos de Trump de diminuir o déficit comercial dos EUA. Afinal, com o dólar valorizado, os produtos americanos ficam mais caros no exterior, e as exportações caem.
🔎 Déficit comercial? É quando os EUA compram mais do que vendem para outros países. O contrário é superávit.
André Perfeito, economista, acha que, mesmo que empresas multinacionais atendam aos pedidos de Trump e montem fábricas nos EUA, isso não resolve o problema do déficit comercial crônico do país. “Não adianta taxar tudo em 15% se o dólar tá 15% mais forte. É zero a zero! Por isso, muita gente acha que o dólar precisa se desvalorizar, e as ações de Trump vão nessa direção”, afirma Perfeito.
Para André Roncaglia, diretor-executivo do FMI no Brasil e professor da UnB, o objetivo de Trump é claro: depreciar o dólar sem perder o status de moeda reserva global. “A ideia é manter a demanda pelo dólar como ativo de reserva e moeda para transações internacionais”, explica Roncaglia.
Efeito Trump: o tarifaço
As tarifas impostas por Trump aumentaram a insegurança na economia global, impactando o comércio internacional. Uma consequência? O enfraquecimento do dólar, mesmo sendo a moeda mais segura do mundo.
Isso já foi visto logo após o “tarifaço” de Trump, em abril, quando o dólar caiu contra moedas de países desenvolvidos. O maior medo? Inflação alta e desaceleração da economia americana.
O índice DXY, que compara o dólar a outras seis moedas fortes (euro, iene, etc.), já caiu mais de 10% em 2025 por causa da política econômica de Trump.
Essa incerteza também fez o preço do ouro disparar. O ouro, considerado um investimento seguro em tempos de crise, subiu quase 40% em 2025.
Já o real, apesar de ser uma moeda emergente, se valorizou quase 14% em 2025, aproveitando a queda do dólar. Nesta sexta-feira, o dólar fechou a R$ 5,32, refletindo também a diferença de juros entre Brasil e EUA.
“Não é o real que tá forte, é o dólar que tá fraco. Não é porque o Brasil tá fazendo algo melhor. Seis não é igual a meia dúzia”, explica André Perfeito.
A força do dólar se deve à sua demanda como moeda global de reserva. Perfeito usa uma analogia: “Igual a uma rede social, todo mundo usa, então todo mundo continua usando.” Isso dá aos EUA um “privilégio exorbitante”, permitindo que consumam e importem à vontade sem o dólar desvalorizar naturalmente.
Nem só Trump quer um dólar mais fraco
Mas a força do dólar também tem seu custo. Por isso, de tempos em tempos, os EUA tentam diminuir seu valor para reequilibrar as contas externas. Três exemplos históricos:
➡️ **1971:** Nixon encerrou a conversão do dólar em ouro. O dólar desvalorizou, mas a inflação nos EUA subiu, e os juros também.
➡️ **1985:** O Acordo de Plaza, com EUA, Alemanha Ocidental, Japão, Reino Unido, Canadá e França, enfraqueceu o dólar. Mas os gastos e o déficit fiscal americano limitaram os resultados.
➡️ **2009:** Obama tentou fazer a China valorizar o yuan, mas o dólar continuou forte por causa da demanda global por ativos seguros.
Roberto Dumas, professor do Insper e autor de “China x EUA: Como a economia global e a geopolítica se comportarão no pós-pandemia”, diz que a guerra comercial de Trump é uma tentativa de desvalorizar o dólar e aumentar as exportações. Mas ele duvida que dê certo a longo prazo. O problema das contas externas dos EUA não se resolve só com dólar fraco ou tarifas. A baixa poupança e o alto consumo também pesam muito. “Trump não entende direito os conceitos macroeconômicos. Os EUA gastam demais e poupam de menos. Se poupassem mais, os problemas externos seriam menores”, afirma Dumas.
Ataques ao Fed
Os economistas também apontam os ataques de Trump ao Fed como uma forma de desvalorizar o dólar. Roncaglia explica que a ideia é diminuir a entrada de capitais nos EUA. “Com juros menores e mais crédito, outros países ficam mais atrativos para investimentos. Os investidores ainda querem dólar, mas em outros lugares, sem pressionar o câmbio. A desvalorização é leve, mas o dólar continua como moeda reserva”, diz Roncaglia.
Trump criticou muito Jerome Powell, presidente do Fed, chamando-o de “burro” e “teimoso”. Agora, ele quer indicar pessoas alinhadas à sua política econômica para o Fed.
Na última quarta (17), o Fed reduziu os juros em 0,25 ponto percentual, para 4% a 4,25% ao ano. Foi o primeiro corte em nove meses. Stephen Miran, indicado por Trump, votou contra, querendo uma redução maior (0,50 ponto).
O papel das stablecoins
A redução de juros nos EUA, desejada por Trump, pode tornar os títulos do Tesouro americano menos atrativos. Para evitar isso, o governo Trump está apostando em stablecoins (moedas digitais atreladas ao dólar).
🔎 Em julho, Trump aprovou o Genius Act, a primeira lei federal a regular stablecoins nos EUA. A lei exige regras rígidas sobre reservas e transparência.
A ideia é que as stablecoins sejam lastreadas por ativos seguros, como títulos do Tesouro americano, aumentando a demanda por esses títulos.
“Se eu emito uma stablecoin que vale US$ 100, e você me paga US$ 100, eu compro títulos do governo”, explica Perfeito. As stablecoins são intermediárias: os usuários compram a moeda digital, e o emissor compra títulos do governo.
Roncaglia explica que isso aumenta o preço dos títulos e reduz os juros. “A redução de juros pelo Fed é acompanhada por esse processo, com investidores estrangeiros aceitando juros menores para financiar a dívida americana”, diz ele.
Mas os economistas não garantem o sucesso dessa estratégia. “São muitos fatores envolvidos. Depende se o mercado vai comprar essa ideia”, conclui Roncaglia.
Fed reduz juros dos EUA pela 1ª vez em 9 meses para 4% a 4,25% ao ano.
Fonte da Matéria: g1.globo.com