A morte a tiros do senador e pré-candidato à presidência da Colômbia, Miguel Uribe, na segunda-feira (11), reacendeu temores de um retorno à violência política que assolou o país nas décadas de 80 e 90. A execução, ocorrida em junho, foi apenas o ponto mais extremo de uma onda de atentados contra políticos que, na real, já vinha crescendo. Muitos desses ataques, inclusive o contra Uribe, aconteceram em plena luz do dia, um cenário que trouxe de volta memórias dolorosas para muitos colombianos.
A mãe de Uribe, a jornalista Diana Turbay, também foi vítima de um atentado, sendo sequestrada e assassinada pelo grupo de narcotraficantes “Os Extraditáveis”, ligado ao infame Pablo Escobar. A lembrança desse passado sangrento, com mais de 200 mil mortos segundo dados de organizações de direitos humanos, pesa como uma sombra sobre o presente.
Só em junho, Cali, município estratégico para o tráfico de drogas, sofreu 24 ataques em apenas cinco horas, deixando oito mortos e 62 feridos entre civis e policiais. A violência foi brutal: carros-bomba, granadas e rajadas de fuzil contra quartéis e prédios públicos. Isso é assustador, né?
Uribe, de 39 anos, foi atingido pelas costas durante um ato político em Bogotá, a um ano das eleições presidenciais. Ele era um crítico ferrenho do atual presidente, Gustavo Petro, e ficou dois meses em estado crítico após o atentado. Um adolescente de 15 anos foi preso e, em vídeo divulgado pela Reuters, confessou o crime, alegando ter agido por dinheiro. As investigações continuam, mas o governo admite que o modus operandi lembra muito o terror imposto por guerrilheiros, paramilitares e cartéis no passado.
“É inaceitável que tenhamos voltado a 1989”, desabafou o prefeito de Cali, Alejandro Eder, ao jornal “El Tiempo”. De fato, o ataque a Uribe representa o mais grave atentado contra uma figura política desde a campanha presidencial de 1990, quando Luis Carlos Galán, Bernardo Jaramillo e Carlos Pizarro – este último, ex-líder do M-19 – foram assassinados.
Essa nova onda de violência está intrinsecamente ligada à polarização política em torno da “paz total”, a política de Petro que busca negociações com grupos armados. A oposição acusa o presidente de leniência com os rebeldes, alegando que isso resultou no fortalecimento de grupos como o Estado-Maior Central (EMC), a maior facção dissidente das Farc, liderada pelo temido “Iván Mordisco”, homem mais procurado do país e com uma recompensa de cerca de um milhão de dólares pela sua captura.
O EMC, junto com o ELN (Exército de Libertação Nacional), disputa o controle de territórios e rotas do tráfico de drogas, usando táticas que lembram os anos 90. Andrew Traumann, professor de relações internacionais e autor do livro “Os Colombianos”, explica à DW que essas ações visam afastar a polícia de áreas controladas pelo narcotráfico. Olha só, grupos como o EMC, ELN e o Clan del Golfo estão disputando o “espólio” dos antigos cartéis de Cali e Medellín.
A “paz total” de Petro, iniciada em agosto de 2022, buscava acordos semelhantes ao que desmobilizou as Farc em 2016, mas, segundo Traumann, as negociações têm avançado pouco e a Justiça Especial para a Paz tem sido lenta. Isso fortalece os grupos que não aderiram à paz.
A violência já causou estragos: em janeiro, um conflito entre o ELN e dissidentes das Farc no nordeste do país deixou 100 mortos, a maioria civis. Petro chegou a suspender negociações e reativar ordens de prisão contra líderes do ELN. A ONU estima que quase 1 milhão de pessoas foram afetadas pela violência armada entre janeiro e abril de 2025 – quatro vezes mais que no ano anterior. O CICV e a Human Rights Watch também registram um aumento significativo em homicídios e sequestros. A Arquidiocese de Bogotá, em comunicado recente, alertou para o risco de guerra civil.
A polarização política se intensifica, principalmente contra Petro, que não pode se candidatar à reeleição em 2026. Sua política de “paz total” é criticada pela oposição, que o acusa de incitar o ódio e de ser conivente com a violência. Nove legendas boicotaram uma reunião convocada por Petro para discutir segurança visando as eleições de 2026. A oposição também afirma que a tentativa de assassinato de Uribe é consequência dessa polarização. O advogado de Uribe declarou que ele havia solicitado reforço na segurança diversas vezes.
A crise de segurança também se sobrepõe a uma disputa em torno de uma reforma trabalhista proposta por Petro. Após o Senado rejeitar o projeto, Petro ordenou uma consulta popular, medida considerada ilegal pela oposição, que recorreu a instâncias internacionais. Petro, inclusive, chegou a suspender temporariamente a consulta após o atentado contra Uribe, mas depois voltou atrás e deve participar de uma mobilização em Cali.
Andrés Hoyos, em artigo no “El Espectador”, afirma que o atentado contra Uribe foi “o que faltava” para que as ameaças ao Estado de direito se tornassem realidade, colocando em risco as instituições colombianas. Em resumo, a Colômbia vive um momento crítico, com a violência política ameaçando minar a frágil democracia do país.
Fonte da Matéria: g1.globo.com