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Angela Ro Ro: A voz rouca que ecoará para sempre na MPB

Angela Ro Ro, a icônica cantora e compositora carioca, nos deixou na manhã desta segunda-feira, 8 de setembro de 2025. Aos 75 anos, ela faleceu no Hospital Silvestre, no Rio de Janeiro, onde estava internada desde julho para tratar uma infecção pulmonar. A notícia pegou a todos de surpresa, principalmente porque apenas dois dias antes, Maria Bethânia havia estreado um show comemorativo aos seus 60 anos de carreira, incluindo duas canções de Angela Ro Ro no repertório: “Gota de sangue” e a inédita “Mares da Espanha”. Bethânia, aliás, foi uma das artistas que ajudaram a lançar a jovem Ro Ro em 1979, um ano marcante para as mulheres na MPB.

Olha só, que ironia: a primeira música gravada de Angela Ro Ro, “Não há cabeça” (1979), interpretada por Marina Lima no álbum “Simples como fogo”, contempla o verso “Não há princípio que resista ao fim”. Um verso que, infelizmente, se tornou profético. Angela Maria Diniz Gonsalves – sim, com “s” e não “ç” – deixou para nós um legado inesquecível.

Ela era uma mistura improvável de Maysa e Janis Joplin, sabe? Uma artista que vivia intensamente, guiada pela emoção, sempre acima da razão. Como ela mesma cantou em “Não há cabeça”: “tudo sentiu, disse e fez”. Sua vida foi uma montanha-russa de emoções, mas sua voz rouca, a marca registrada que lhe rendeu o apelido de Ro Ro, era incrivelmente afinada e expressiva. Uma das mais belas vozes do Brasil, sem dúvida!

E falando em voz, ela não se calava. Angela Ro Ro era sincera, falava o que pensava, mesmo que isso a levasse a confusões. Na real, ela foi a primeira cantora famosa da MPB a assumir publicamente sua homossexualidade, logo em 1979, sem rodeios. Isso se refletiu em letras diretas e sem pudores, como em “Tola foi você” (1979) e “Gata, moleque, ninfa” (1984).

Mas, além de tudo isso, Angela Ro Ro era uma compositora brilhante. Suas canções são verdadeiras obras-primas, que misturam o lamento do blues, a atitude do rock, o swing do boogie e a melancolia do samba-canção. “Balada da arrasada”, “Cheirando a amor”, “A mim e a mais ninguém” (parceria com Sérgio Bandeira), “Só nos resta viver” e “Fogueira” são apenas alguns exemplos de sua genialidade. E que dizer de “Amor, meu grande amor”, um sucesso absoluto, parceria com Ana Terra, que ganhou nova vida na década de 1990 com o Barão Vermelho? Incrível!

Angela Ro Ro nunca foi politicamente correta, não mesmo! Mas, apesar das polêmicas, seu humor ácido e sua autenticidade conquistavam a todos. A prova disso são as inúmeras homenagens que surgiram nas redes sociais desde o anúncio de sua morte.

A trajetória dela começou em 1971, na Inglaterra, participando (sem crédito) da gravação de “Nostalgia (That’s what rock’n’roll is all about)”, de Caetano Veloso, para o álbum “Transa”. Glauber Rocha, aliás, quem a indicou para Caetano.

A tristeza que marcou sua vida, alimentada pelo amor e pelo desamor, também permeou suas composições, dando uma profundidade única às suas canções. Álbuns como “Só nos resta viver” (1980), “Escândalo” (1981), “Simples carinho” (1982), “A vida é mesmo assim” (1984) – considerado seu trabalho mais coeso após a estreia – e “Eu desatino” (1985) são testemunhas dessa jornada. Depois de 1985, lançou outros álbuns, como “Prova de amor” (1988), “Acertei no milênio” (2000) e “Selvagem” (2017), além de alguns registros ao vivo, mas nenhum com o mesmo impacto dos primeiros.

Apesar de uma vida marcada por altos e baixos, a trajetória de Angela Ro Ro foi, acima de tudo, bela. Sua música, sua voz e sua personalidade única permanecerão para sempre na memória de todos nós. Ela desatinou, sim, mas deixou um legado que resistirá ao tempo. Aos fãs, resta cultivar a memória de uma das maiores cantoras e compositoras da música brasileira. Sua voz rouca, sua poesia e sua irreverência jamais serão esquecidas.

Fonte da Matéria: g1.globo.com