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“A Vida de Chuck”: Uma Adaptação Tocadora, Mas Verborrágica, do Conto de Stephen King

“A Vida de Chuck” é, sem dúvidas, uma das melhores adaptações de Stephen King dos últimos anos. Cheia de ternura e otimismo, a película estreia nesta quinta (4) e conquista pelo coração, mesmo pecando pelo excesso de narração. Sabe? Parece que, por medo de se afastar do conto original, o diretor Mike Flanagan – mestre do terror em séries como “A Maldição da Residência Hill” e “Missa da Meia-Noite” – cai na armadilha do “conte, não mostre”.

Desta vez, Flanagan troca os sustos por uma narrativa mais humana, repleta de dança, música e reflexões existenciais. O elenco é de primeira: Chiwetel Ejiofor (“12 Anos de Escravidão”) e Tom Hiddleston (“Loki”) lideram o time, com a participação de alguns colaboradores antigos do diretor. A única coisa que falta, na minha opinião, é um pouco mais de ousadia para transgredir a obra original e traduzir a filosofia de King para uma linguagem mais cinematográfica. Às vezes, o maior respeito é “desrespeitar” um pouco para capturar a essência, né?

Mas olha só: o filme já levou o Prêmio do Público no Festival de Toronto de 2024! Isso aumenta e muito suas chances no Oscar. Desde 2013, todos os vencedores de Toronto são lembrados pela Academia.

Do Apocalipse à Vida Mundana de Chuck

Assim como no conto presente em “Com Sangue”, o filme se divide em três partes, apresentadas em ordem cronológica inversa. A melhor delas acompanha um professor apático (Ejiofor) diante do fim do mundo, intrigado pelas propagandas que agradecem a um misterioso “Chuck” por 39 anos incríveis. As outras duas partes desvendam o enigma, mostrando a vida, aparentemente comum, de Chuck: um contador interpretado por Hiddleston, desde a juventude até a meia-idade (com Cody Flanagan, filho do diretor, e Jacob Tremblay, de “O Quarto de Jack”, entre os atores mirins).

Hiddleston, apesar de ser o rosto mais conhecido do elenco, não carrega o peso emocional da narrativa sozinho. Embora tenha uma sequência de dança incrível, digna dos grandes musicais, ao lado de Annalise Basso (“Capitão Fantástico”), a atuação de Ejiofor – e dos outros personagens em diferentes fases do luto, como Karen Gillan (“Guardiões da Galáxia”) – funciona como uma âncora emocional mais forte. Talvez por causa da separação entre sua história (a primeira apresentada) e o resto da trama.

A Falação que Enfraquece a Magia

A força das atuações e a beleza da trama são, infelizmente, prejudicadas pelas constantes narrações (na voz suave de Nick Offerman, de “Parks and Recreation”), que parecem ler o livro diretamente. O roteirista deveria ter encontrado formas mais cinematográficas de traduzir os pensamentos do autor, como o próprio King faz no conto, ao mudar a perspectiva e usar o diálogo para mostrar as emoções.

Essa narração excessiva mostra a dificuldade de Flanagan com a adaptação. Em vez de uma ferramenta narrativa, ela se torna uma deferência exagerada à obra original. Mesmo com a voz agradável de Offerman, longas sequências acabam ficando cansativas e repetitivas.

O Legado de um Mestre

Aos 77 anos, Stephen King continua um dos escritores mais prolíficos da história. E o número de adaptações de suas obras é impressionante – um mistério à altura de seus próprios contos! O mais curioso é que, mesmo com tantos filmes de terror e suspense, as melhores adaptações são de obras mais leves.

Isso aconteceu com “Conta Comigo” (1986) e “Um Sonho de Liberdade” (1994), ambos de “Quatro Estações” (1982). “A Vida de Chuck”, de outro livro de quatro contos publicado quase 40 anos depois, se aproxima dessa qualidade. A ironia é que bastaria ter deixado a voz do autor um pouco de lado.

Fonte da Matéria: g1.globo.com