A foto de Muhammad, um bebê com os ossos à mostra usando um saco plástico como fralda, chocou o mundo. A imagem, tirada pelo fotógrafo Ahmed al-Arini em Gaza, retrata a terrível realidade da fome extrema que assola a região. A mãe e o filho, deslocados de sua casa no norte de Gaza, vivem em uma tenda vazia, que Ahmed descreve como “um túmulo”. A falta de ajuda humanitária fez os preços dispararem, tornando até itens básicos inacessíveis. “Cara, foi difícil tirar as fotos”, confidenciou Ahmed. “Tive que parar várias vezes para recuperar o fôlego.”
Segundo o Ministério da Saúde de Gaza, administrado pelo Hamas, nove pessoas morreram de desnutrição nas últimas 24 horas. No total, 122 pessoas, incluindo 83 crianças, perderam a vida por falta de alimentos desde o início do conflito, de acordo com o ministério. A situação é desesperadora. Olha só o caso de Mosab, um garoto de 14 anos ferido em um ataque aéreo. A BBC News Arabic relata que ele, que pesava 40 kg antes do incidente, agora mal chega aos 10 kg por causa da falta de comida e remédios. A mãe dele, Shahenaz Al Debs, está devastada.
O diretor médico do hospital al-Shifa, Hassan al-Shaer, afirma que o número de casos de desnutrição está crescendo assustadoramente. “Inicialmente, afetava só crianças, mas agora vemos casos em todas as faixas etárias”, lamentou ele, acrescentando que o tratamento é dificultado pela falta de suprimentos. A UNRWA (Agência da ONU para Refugiados Palestinos) afirma que, na Cidade de Gaza, uma em cada cinco crianças está desnutrida, e a situação piora a cada dia. Em comunicado na quinta-feira (24), o Comissário-Geral da UNRWA, Philippe Lazzarini, citou um colega que descreveu a situação com uma frase impactante: “As pessoas em Gaza não estão nem mortas nem vivas, são cadáveres ambulantes.”
Mais de 100 organizações internacionais de ajuda humanitária e grupos de direitos humanos alertam para a fome em massa e pressionam governos a agirem. Israel, que controla a entrada de suprimentos em Gaza, nega a existência de um cerco, culpando o Hamas pela desnutrição. A ONU, porém, afirma que o nível de ajuda é irregular e que a crise de fome “nunca foi tão grave”.
A desnutrição tem consequências devastadoras, explica Smitha Mundasad, repórter de saúde da BBC News. Crianças menores de cinco anos, adolescentes, gestantes, lactantes, idosos e pessoas com doenças crônicas são os mais vulneráveis. A imunidade cai drasticamente, deixando-as suscetíveis a infecções que podem ser fatais. A desnutrição está associada a quase metade das mortes de crianças menores de cinco anos. Os sintomas podem ser óbvios – perda de peso, fraqueza – ou mais ocultos, como anemia. Em casos graves, como o de muitos em Gaza, pode ocorrer Kwashiorkor, com inchaço no rosto, barriga e pernas, apesar da magreza extrema.
Em meio à pressão internacional, a rádio oficial do exército israelense anunciou na sexta-feira (25) a possibilidade de lançamentos aéreos de ajuda humanitária nos próximos dias, possivelmente pela Jordânia e Emirados Árabes Unidos. No entanto, experiências passadas com esse método, em 2024, mostraram-se ineficientes e até perigosas, com suprimentos caindo no mar e pessoas se machucando ou morrendo.
Reino Unido, França e Alemanha, em comunicado conjunto na sexta-feira, pediram o fim imediato da guerra em Gaza, a libertação dos reféns e o atendimento às necessidades básicas da população. Os países exortaram Israel a permitir o trabalho da ONU e ONGs e a cumprir suas obrigações sob o Direito Internacional Humanitário. A França, aliás, anunciou o reconhecimento oficial do Estado palestino, decisão saudada pelas autoridades palestinas e criticada por Israel. A Alemanha, por sua vez, descartou essa medida por enquanto. O clima na Alemanha em relação ao conflito mudou bastante, com uma queda significativa na aprovação das ações de Israel.
*Com informações da live da BBC News, editada por Neha Gohil, com análises de Jeremy Bowen e Lyse Doucet.
Fonte da Matéria: g1.globo.com