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** Nobel de Economia: Brasil tem pouco a perder com retaliação a Trump, e ele respeita coragem

** Um estudo estima que o PIB brasileiro pode sofrer uma perda de até R$ 175 bilhões com a tarifa de importação de 50% imposta pelo governo Trump sobre produtos brasileiros. A situação coloca o Brasil numa saia justa em suas relações com os EUA, com a entrada em vigor das tarifas prevista para o dia 1º de agosto. E agora? Qual a melhor estratégia?

Para o renomado economista Paul Krugman, ganhador do Nobel de Economia em 2008 e professor na Universidade da Cidade de Nova York, a resposta é simples: retaliação. Em entrevista exclusiva à BBC News Brasil na quarta-feira (24/07), Krugman afirmou que o Brasil teria pouco a perder com uma resposta na mesma moeda, aumentando as tarifas sobre produtos americanos importados. “Na real, tudo indica que a chance de fazer o Trump recuar é bem maior mostrando coragem e disposição para reagir, do que oferecendo concessões”, explicou o especialista em comércio internacional. “Não acredito que isso vá mudar a política americana, mas pode funcionar, sabe?”.

Apesar das ameaças de Trump de impor tarifas ainda maiores em caso de retaliação brasileira, Krugman acredita que essa é a melhor alternativa. O governo brasileiro, por sua vez, ainda não definiu sua estratégia, mas afirma estar negociando com os EUA para evitar o “tarifaço”. Krugman reconhece que o Brasil poderia oferecer algumas reduções tarifárias, já que suas tarifas sobre produtos americanos são levemente superiores à média de outros países. Mas, segundo ele, “isso não vai nem chegar perto de satisfazer o governo Trump”.

A longo prazo, a retaliação, segundo Krugman, poderia ser mais eficaz. “Pode chegar um dia em que Trump e sua equipe percebam a futilidade de tentar intimidar o Brasil, e essa data pode ser antecipada com uma resposta firme”. O economista critica as decisões de Trump, que, segundo ele, ignoram acordos internacionais e demonstram que os EUA “fazem o que querem”, sem respeitar tratados assinados pelo próprio país.

**Trump e Bolsonaro: uma “alma gêmea”?**

Krugman, um dos economistas mais influentes do mundo, conhecido por suas colunas (antes no The New York Times, agora no Substack), analisou a situação do Brasil em dois artigos recentes. Num deles, ele chamou as tarifas de Trump de “demoníacas e megalomaníacas”. Em outro, elogiou o PIX, o sistema de pagamentos brasileiro, afirmando que o Brasil “pode ter inventado o futuro do dinheiro”.

Na entrevista, Krugman descartou a hipótese de um grande problema ideológico por trás das ações de Trump contra o Brasil, como o alinhamento do país com a China no BRICS. Para ele, a carta de Trump para o presidente Lula deve ser interpretada ao pé da letra: uma demonstração de indignação com o julgamento de Jair Bolsonaro. “Olha só, a primeira coisa que ele menciona é a ousadia do Brasil em levar a julgamento um ex-presidente que tentou anular uma eleição. Para Trump, isso é pessoal. Ele vê Bolsonaro como uma alma gêmea. É isso”, disse Krugman. “Tipo assim, Trump tá dizendo: ‘Eu tentei derrubar uma eleição e ninguém me puniu. Então, como o Brasil ousa fazer isso com o Bolsonaro?'”

**PIX: uma ameaça “insana” aos EUA?**

A inclusão do PIX na investigação comercial americana, sob a Seção 301, que acusa o sistema de práticas comerciais ilegais, foi classificada por Krugman como “fundamentalmente insana”. Ele argumenta que a eficiência do PIX, que está superando os sistemas de pagamento americanos, não configura prática desleal. “Se um país tem um sistema de pagamentos melhor do que o oferecido por empresas estrangeiras, isso é perfeitamente razoável. Na minha opinião, quem está violando a lei do comércio internacional são os EUA”, afirmou. A popularidade do PIX também teria irritado o setor de criptomoedas, segundo Krugman, por entregar o que as criptomoedas prometem, mas não conseguem: baixo custo de transação e maior inclusão financeira.

Krugman expressou preocupação com o futuro da democracia nos EUA, considerando alta a probabilidade de historiadores futuros considerarem 2025 como o ano do fim da democracia americana. Por outro lado, ele elogiou a resposta das instituições brasileiras aos ataques sofridos pela democracia nos últimos anos.

**Trechos da entrevista:** A entrevista completa com Krugman à BBC News Brasil abrangeu diversos tópicos, incluindo:

* **Retaliação vs. Negociação:** Krugman reforça a ideia de que o Brasil tem pouco a perder com a retaliação, considerando a menor relevância comercial dos EUA para o Brasil em comparação com a China e a União Europeia.
* **Moeda Digital do Banco Central:** Krugman destaca a surpresa com a inovação tecnológica do Brasil no setor financeiro e afirma que a criação de uma moeda digital não é tecnicamente complexa, sendo os principais obstáculos políticos.
* **Investigação do PIX:** Ele reitera a sua crítica à investigação americana do PIX, considerando-a injusta e uma defesa dos interesses de doadores do governo Trump.
* **PIX vs. Criptomoedas:** Krugman destaca a superioridade do PIX em relação às criptomoedas em termos de funcionamento e inclusão financeira, o que explicaria a resistência do setor.
* **Importância estratégica do Brasil:** Ele atribui a atenção de Trump ao Brasil principalmente à sua indignação com o julgamento de Bolsonaro, minimizando o papel ideológico do alinhamento do Brasil com a China e os BRICS.
* **Eficácia da estratégia de Trump:** Krugman considera as concessões tarifárias obtidas por Trump pequenas e sem grande substância, destacando que o impacto das tarifas nos preços ao consumidor nos EUA ainda está por vir.
* **Consequências da guerra comercial:** Ele considera improvável uma recessão nos EUA, mas prevê um aumento nos preços ao consumidor, resultado negativo para os EUA.
* **Reversibilidade das mudanças:** Krugman acredita que a situação é reversível a longo prazo, dependendo de mudanças políticas nos EUA e da capacidade do país em rejeitar impulsos autoritários.
* **Reação institucional à ameaça democrática:** Ele destaca a reação positiva do Brasil aos desafios à democracia, em contraste com a situação nos EUA, onde expressa grande preocupação com o futuro da democracia americana.

Em resumo, a análise de Krugman aponta para uma situação complexa, mas com possibilidades de resposta eficaz por parte do Brasil. A coragem de retaliar, segundo ele, pode ser a chave para lidar com as ações do governo Trump.

Fonte da Matéria: g1.globo.com